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Veja como como reconhecer a atividade especial a partir dos Direitos Trabalhistas e Previdenciários

Karen Nicioli Vaz de Lima e Bianca Santi*

Há muitos trabalhadores e trabalhadoras expostos a riscos que não têm esses perigos mensurados em documentos e, por consequência, perdem a chance de se aposentar mais cedo ou de receber o benefício no valor correto. 

Para que esses profissionais não sejam prejudicados, eles precisam estar atentos ao que é atividade especial. Será que as condições em que trabalharam por anos, contribuindo com o INSS, se enquadram nessa classificação e dão direito a compensações na hora de se aposentar? 

Essa é uma dúvida comum de quem atua exposto a ambientes com risco à sua integridade física. E, se seu histórico tiver mesmo trabalhos com atividade especial, como reconhecê-la e o que fazer quando a documentação que comprova essa situação está incompleta ou ausente? 

1) Entendendo o que é atividade especial sem complicações

Chamamos de atividade especial aquela em que o trabalhador permanece exposto, de modo habitual e permanente, a agentes nocivos, sejam físicos, químicos, biológicos, ou a condições que prejudicam ou colocam em risco a saúde. O objetivo da sua caracterização é reduzir o tempo de exposição, permitindo que o trabalhador se aposente mais cedo ou com regras diferenciadas.

Nas classificações do Direito do Trabalho e da Previdência aparecem também os termos insalubridade, periculosidade e penosidade, que se relacionam, mas não são sinônimos. Veja a diferença entre eles:

  • Insalubridade: exposição a agentes físicos, químicos ou biológicos.
  • Periculosidade: risco iminente à vida (ex.: vigilante armado).
  • Penosidade: atividades mais densas, sobrecarregadas, como o desgaste físico/mental acrescido. Nessa situação, há debates sobre como configurá-las.

Para o reconhecimento previdenciário, o ponto central é avaliar se houve exposição a agente nocivo na forma prevista em lei e normas técnicas. Se sim, pode haver enquadramento como tempo especial. 

Mas não basta apenas a caracterização, a atividade especial deve ser comprovada.

2) Documentos que importam e por que o PPP é fundamental

O documento que funciona como “porta de entrada” de comprovação é o Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP). Ele contém dados essenciais sobre a atividade especial, como função, agentes presentes no ambiente de trabalho, metodologia de medição, responsáveis técnicos, períodos de exposição, equipamentos de proteção individual (EPIs) fornecidos, entre outros campos técnicos.

Quanto ao direito de obter o documento, tem-se que o preenchimento do PPP é obrigatório e deve ser entregue ao trabalhador no ato da rescisão. Se a empresa falha, ela pode ser sujeita a sanções administrativas e até multa. A legislação prevê penalidades pecuniárias pela falta de sua entrega.

No âmbito trabalhista, a legislação estabelece a obrigação do empregador de manter documentação completa e verossímil sobre o ambiente laboral. Essas informações são essenciais para que o PPP traduza a realidade vivida pelo trabalhador. 

Quando esse documento omite dados sobre exposição a agentes nocivos ou descreve condições divergentes daquelas efetivamente enfrentadas, o prejuízo pode ser significativo. O problema costuma se revelar anos após o desligamento, quando o segurado apresenta ao advogado um PPP incompatível com seu histórico profissional. 

A prática tem nos mostrado uma dura realidade. Na rotina, quase ninguém recebe o PPP corretamente. Por isso, a etapa mais técnica, que é conferir o PPP campo a campo, é imprescindível. É raro um PPP estar 100% correto diante da análise profissional.

Além disso, vale um alerta importante sobre os campos de preenchimento, em especial, sobre um determinado campo que alerta sobre as proteções existentes no ambiente de trabalho. Há casos em que o trabalhador não recebe Equipamentos de Proteção Individual (EPIs) adequados. A falta de fornecimento ou de fiscalização desses equipamentos é um problema recorrente e, muitas vezes, a omissão no PPP busca mascarar essa realidade para evitar eventuais condenações trabalhistas. Assim como, por vezes, o mencionado PPP pode informar uso de equipamentos que sequer foram efetivamente entregues ou mesmo que não se adequam ao risco existente no labor.

O trabalhador pode recorrer ao apoio de sindicatos, da Comissão Interna de Prevenção de Acidentes (CIPA), do Ministério do Trabalho ou mesmo de medidas judiciais com advogado particular para regularizar essa situação durante o vínculo laboral. No entanto, muitas pessoas sentem receio de denunciar ou acionar a Justiça enquanto estão empregadas, o que reforça a importância de canais administrativos e de orientação jurídica especializada para garantir condições seguras de trabalho.

3) Reconhecimento sem PPP: o que fazer?

Quando o PPP não existe, foi perdido ou a empresa se recusa a fornecer, o trabalhador não está sem recursos. Há uma sequência de medidas que podem ser realizadas, combinando o Direito Trabalhista e o Previdenciário:

  1. Solicitação formal à empresa para entrega do PPP: na solicitação é feito um registro do pedido, o que gera uma evidência documental para futuras ações.
  1. Denúncia ao Ministério do Trabalho: isso pode gerar fiscalização e multa.
  2. Ação trabalhista específica para retificação do PPP: a Justiça do Trabalho aceita ações declaratórias que podem exigir a correção do documento, sem prazo prescricional específico para essa declaração. Ou seja, mesmo após o prazo de dois anos de desligamento é possível que o trabalhador processe a empresa para entrega e retificação do PPP.
  1. Ação previdenciária de reconhecimento de tempo especial: essa medida ocorre quando já não há alternativa administrativa.
  1. Produção de prova por analogia: advogados juntam laudos e PPPs de colegas, laudos periciais de ações trabalhistas, documentos antigos e depoimentos para formar um “quebra-cabeça” probatório.
  1. Perícia por similaridade: quando a empresa ou o ambiente não existe mais, nos casos de massa falida, por exemplo, é solicitada perícia em empresa com atividade semelhante para demonstrar as condições de trabalho ou documentos anexados. Juízes podem autorizar perícias em locais similares.

Mas se a pessoa segurada e trabalhadora enfrentar a falta de PPP, há outros caminhos. Um exemplo que ajuda a entender como contornar esse problema é o caso, publicado na internet (não foi publicado na internet, foi caso trabalhado internamente no escritório – êxito nosso), de uma aeronauta, profissão popularmente conhecida como aeromoça, que obteve o reconhecimento de aposentadoria especial pelo Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF4) mesmo sem ter o próprio PPP. 

Ela tinha dificuldades de acessar certos documentos como o PPP porque a empregadora com a qual ela trabalhou 12 anos antes havia encerrado atividades e estava em massa falida. Porém, durante o processo trabalhista, foram reunidos laudos de colegas, outras documentações da época, e um novo laudo que reconheceu a insalubridade. O juiz acolheu as provas e reconheceu o tempo especial, mesmo sem o PPP original. Falaremos mais deste caso mais para frente do artigo.

4) Estratégia trabalhista e estratégia previdenciária precisam andar juntas

A atuação combinada do Direito Trabalhista e do Direito Previdenciário é decisiva.

Na Justiça do Trabalho, é possível obter laudo pericial e reconhecimento de insalubridade ou periculosidade, além de reparações e indenizações por omissão documental, como dano moral ou material. Esses laudos e decisões trabalhistas são provas valiosas em ações previdenciárias, com a revisão de benefício e o reconhecimento de tempo especial).

Já na via previdenciária, busca-se a concessão ou mesmo revisão do benefício e o pagamento dos retroativos. Mas é necessário atenção à prescrição e decadência do direito. O INSS e a legislação estabelecem limites para receber esses benefícios atrasados, normalmente os últimos cinco anos à contar do início do processo, o que pode reduzir substancialmente o montante recuperável se o pedido for tardio.

Por isso, a recomendação é que seja feito um planejamento previdenciário enquanto ainda se está trabalhando e, quando necessário, promover ação trabalhista para consolidar provas que depois servirão no INSS ou em ação revisional.

Como vimos, a questão dos prazos influi bastante neste contexto.

5) É preciso estar atendo à prescrição, decadência e prejuízo do atraso

Uma questão prática que precisa ser destacada é que quanto mais tarde a pessoa busca seu direito, menos ela poderá receber a título de atrasados. Pela regra aplicada rotineiramente, há um limite temporal, os chamados prazos prescricionais do INSS, de modo que só são pagos valores referentes aos últimos cinco anos em grande parte das hipóteses.

Ou mesmo, prazos decadenciais, que eliminam a possibilidade de discutir aquele direito, em especial, nos casos de revisão.

6) Exemplificando: a decisão que ilustra a situação concreta e as teses relevantes

Para dar ainda mais contexto, vamos continuar a contar mais detalhes da história da aeromoça que teve reconhecido seu tempo como atividade especial na Justiça. Na situação enfrentada por essa aeronauta, as condições de seu trabalho eram diferenciadas devido à exposição habitual à pressão atmosférica anormal, uma condição que configura atividade especial com amparo em decretos e referências técnicas, inclusive cartilha médica que aponta nocividade da hipóxia. 

A hipóxia é a falta de oxigênio nos tecidos e células do corpo, o que pode acontecer por causa do suprimento sanguíneo inadequado ou por deficiência de oxigênio no sangue (hipoxemia). Essa condição pode levar a problemas graves, como dificuldade para respirar, confusão, frequência cardíaca acelerada e, em casos extremos, ser fatal, pois as células não conseguem “respirar” e gerar energia.

O Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF4) manteve a concessão de aposentadoria especial e negou provimento ao recurso do INSS, retificando critérios de atualização monetária e juros.

Recapitulando, podemos observar pontos da sentença que são orientadores práticos para outras situações:

  • Enquadramento da função como especial por exposição à pressão anormal, a partir de referências legislativas e técnicas.
  • Utilização de provas trabalhistas para suprir ausência de PPP.

Dessa forma, é possível demonstrar a nocividade, provar a habitualidade e permanência da exposição.

7) O que o reconhecimento de atividade especial traz na prática e impacta na vida do trabalhador

Reconhecer atividade especial pode significar uma série de benefícios, como veremos:

  • Aposentadoria mais cedo: redução do tempo necessário de trabalho.
  • Aposentadoria sem incidência do fator previdenciário: quando aplicável, normalmente resulta em benefício mais alto.
  • Revisão de benefício já concedido, com aumento no valor mensal e pagamento de atrasados, dentro dos limites legais.
  • Possibilidade de indenização caso se comprove que a empresa omitiu ou falsificou documentos, ou que a falta do PPP causou prejuízo ao trabalhador.

No exemplo da aeromoça, a revisão resultou em aumento considerável do benefício, que passou de R$1.474 para R$2.538 na comparação da época do pedido, demonstrando o impacto significativo que o reconhecimento pode ter.

Diante disso, o que é possível fazer para acionar da melhor forma o seu direito?

8) Medidas para facilitar o acesso ao direito

  1. Ao sair da empresa, peça o PPP e guarde a via original.
  2. Se não receber o documento, registre pedido formal por escrito, podendo ser por e-mail ou carta com aviso de recebimento.
  3. Guarde qualquer documento como recibos, laudos médicos, comunicações internas, fichas, laudos de colegas.
  4. Procure assessoria jurídica especializada em Direito Trabalhista e Previdenciário antes do pedido de aposentadoria.
  5. Se já estiver aposentado, avalie a revisão rapidamente, afinal o tempo conta para retroativos e com o passar dos anos pode não ser mais possível pleitear a reanálise.
  6. Ao contratar advogado, explique toda a trajetória laboral, incluindo vínculos, períodos, funções, problemas de saúde e documentos disponíveis.

9) Multa por falta do PPP e responsabilidade da empresa

A empresa pode sofrer sanções administrativas, a partir da fiscalização do Ministério do Trabalho, e é passível de penalidade financeira por não entregar o PPP. 

Além disso, se comprovado o prejuízo ao trabalhador, cabe pedido de indenização por dano moral na Justiça do Trabalho. Em muitos casos, a combinação de medidas, administrativo e judicial, é o caminho para obter documentos e reparar danos.

Por fim, enfatizamos duas atitudes fundamentais:

  1. Planejamento previdenciário proativo, ou seja, não espere a aposentadoria bater à porta para descobrir que faltam provas. Consulte um advogado especialista para consultar sobre a sua situação.
  1. Atuação integrada entre Direito Trabalhista e Previdenciária, pois muitas provas importantes vêm da esfera trabalhista, como laudos, perícias, ações sobre insalubridade, e são decisivas na frente previdenciária.

Saiba que reconhecer atividade especial não é apenas uma questão técnica, é uma forma de garantir que o trabalhador tenha seu esforço e seus riscos devidamente reconhecidos pelo sistema previdenciário. 

Quando a documentação está correta e o planejamento começa no tempo certo, o resultado costuma ser uma aposentadoria mais justa, com menos desgaste e menos incertezas. 

O importante é não adiar a busca por orientação. 

Quanto antes o trabalhador entende seus direitos e reúne as provas necessárias, maior a chance de assegurar um benefício que reflita, de fato, a realidade do seu trabalho e da sua vida laboral.